sexta-feira, 23 de agosto de 2013

COMO UMA PESSOA DESCOBRE QUE É GAY?



A parte mais legal de ter uma coluna aberta a comentários é poder ter um termômetro de como anda o mundo. Ninguém precisa se identificar para comentar, então as pessoas deixam ali tudo aquilo que está dentro delas e muitas vezes elas têm medo de compartilhar com o mundo.

O texto de ontem – sobre falar de sexo com os filhos - foi elogiado por mais de 90% dos comentários. Quem acompanha a coluna sabe quão raro é isso. Normalmente as pessoas comentam apenas para colocar seus demônios e frustrações para fora. Mas um comentário me chamou atenção e achei que seria interessante para todo mundo que eu o respondesse por aqui:


“O que não entendo é, por exemplo, quando ela fala claramente que ninguém nasce sabendo e que aprendemos com o ambiente e tal, se ela tem essa visão tão clara, como não entende que o comportamento sexual pode ser aprendido ou estimulado também? É uma questão de lógica e coerência. A Xuxa aprendeu a ser promíscua sexualmente em função de um abuso que sofreu na infância, ou seja, aprendeu da maneira e com a pessoa errada sobre "sexo", deu no que deu. Alegam que não se deve bater na criança porque ela tende a repetir este mesmo comportamento aprendido na infância quando adulta, então, por que mudam de opinião quando o assunto é heterossexualidade ou homossexualidade? Aí, neste caso específico, as crianças já não aprendem mais nada, não são influenciadas por mais nada e já nasceram sabendo de tudo? Confesso que não entendo estes 2 pesos e 2 medidas, contraditório!”

O primeiro ponto é sobre a Xuxa. Não sou fã, não acompanho o trabalho ou vida dela, mas também nunca ouvi nada sobre ela ser promíscua. Sei que ela, antes dos 18 anos, fez um filme erótico com um garoto que também tinha menos de 18. Não é abuso, nem promiscuidade, é algo que não era tão chocante na época, por mais que hoje o seja.

O abuso que ela sofreu deixou marcas, claro. Mas não a tornou promíscua, a tornou fechada, deixou-a com medo de tudo e encarando o sexo de uma maneira negativa. É isso que abusos normalmente fazem com as pessoas, as tornam reféns de uma lembrança.

O segundo ponto é sobre bater em crianças. A questão é assim: se a criança aprende que as coisas se resolvem dessa maneira, ela pode, sim, repetir esse padrão. Poder não quer dizer que ela irá. A verdade é que violência não resolve nada e esse é o argumento máximo sobre o assunto.

Agora, chegamos ao motivo do post, o que acredito interessar a maior parte das pessoas: as crianças ou adultos aprendem a ser gay? E a resposta é não. Assim como ninguém aprende a ter interesse por sexo. A criança, desde pequena, toca seus genitais. Ela está conhecendo o corpo. Em dado momento ela nota que aquele toque dá prazer. A sexualidade está presente no ser desde o princípio, a diferença é a maneira que ela é abordada.

A primeira coisa que você sabe é que seu corpo dá prazer – não com essa clareza, obviamente, mas em relação a sensações gostosas. Depois disso você começa a notar que se interessa, sentimentalmente, por essa ou aquela pessoa. Isso, assim como a sexualidade, está dentro de você, não importa a orientação sexual.

O que difere o comportamento das pessoas é a decisão de aceitar seus impulsos ou bloqueá-los. E isso tem, sim, bastante a ver com a criação, mas não só com isso. Quem cria filhos livres, terá filhos que buscam a felicidade sem se importar com a opinião do outro. Quem cria filhos cheios de amarras, terá filhos que tentam fugir de si mesmos para agradar aos outros. Mas os impulsos estão sempre dentro das pessoas, independentemente de ser criados por pais gays ou héteros.

Mas o interesse pelo gênero oposto, pelo mesmo gênero ou a falta de desejo está dentro de cada um, não é aprendida. O que é aprendido é o que fazer com esse desejo. Como a sociedade é heteronormativa – que baseia suas ideias em um conceito de que todas as pessoas são heterossexuais até que se prove o contrário -, quem não se vê refletido nessa imagem sente-se excluído.

A comparação mais simples é que você não precisa que ninguém te fale se você gosta de frio ou calor. Você, desde criança, sente isso. Sabe que o calor dá certas sensações e que o frio dá outras. E sabe como se sente com cada uma delas. Com a orientação sexual é a mesma coisa. Você sabe o que sente ao olhar para uma menina e o que sente ao olhar para um menino. Ninguém precisa te dizer.

É normal ver pais dizendo aos filhos “quando você for grande e namorar uma menina” ou incentivar garotas a buscarem o amor de suas vidas, seus príncipes encantados. Isso não os tornará hétero caso eles não o sejam, como o contrário não os tornaria gays. O ideal seria que todos nós apenas quiséssemos que as pessoas fossem felizes. Sozinhas, acompanhadas, gays ou héteros. E que encontrassem pessoas que as respeitassem e caminhassem ao seu lado, se for essa sua vontade.

Há estudos sobre gens gays que explicam a questão, mas não vou entrar nessa parte científica, assim como não entrei ontem. É uma explicação simples e lógica. Qualquer pessoa gay pode dizer como se sentiu a primeira vez, quando adolescente, que teve atração por alguém do mesmo gênero. O medo, a insegurança e a sensação de que aquilo era o certo se misturando em sua cabeça. Não por não saber quem se é, mas por medo da maneira que o mundo receberia essa verdade.

Você tem alguma dúvida sobre sexo? Manda para mim no preliminarescomcarol@yahoo.com.br e siga-me no Twitter (@carolpatrocinio).

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